Capítulo 66 - Divindade do Outono
“O que você está fazendo?” Chen Xing enfiou a cabeça para espiar dentro do quarto e viu que Xiang Shu tinha acabado de trocar de roupa. Nos pés, ele usava um par de tamancos de couro, mas as partes de madeira tinham sido substituídas por couro; isso fazia com que o par parecesse frágil, e, assim como os tamancos de madeira, cada sapato tinha duas tiras de corda para prendê-lo no lugar. Xiang Shu vestia uma roupa marcial com duas camadas, forrada e sem forro, e calças marciais que chegavam ao tornozelo. Os tamancos de couro que usava o faziam parecer praticamente descalço. Ele estava muito estiloso e bonito.
“Vou sair”, disse Xiang Shu, “e relaxar.”
Chen Xing perguntou: “Sozinho?”
Xiang Shu respondeu: “Algum problema?”
Chen Xing tomou a iniciativa e disse: “Eu quero ir com você.”
Xiang Shu disse: “Com tantas pessoas te convidando para sair hoje, por que você não vai encontrar o imperador?”
Chen Xing pensou: Como você ficou sabendo que Sima Yao me convidou? Então respondeu: “Não vou.”
Xiang Shu: “E quanto a Feng Qianjun? Xiao Shan?”
Chen Xing: “Por que de repente você está tão chato? De qualquer forma, estou saindo.”
“Pode ir então.” Xiang Shu não carregava sua espada pesada nas costas; estava com as mãos livres, apenas ajustou as mangas de seu traje de artes marciais, antes de se virar e sair do quarto. Chen Xing então seguiu atrás de Xiang Shu, mantendo uma distância nem próxima nem muito longe. Hoje, Xiang Shu caminhava bem devagar, um contraste gritante com sua passada larga habitual que sempre deixava Chen Xing ofegante. Eles saíram para o Beco Wuyi, onde fica a Residência Xie.
Diante da porta de cada casa, pequenos bonecos e cavalinhos feitos de papel dourado recortado estavam pendurados. Os galhos das árvores de bordo estavam completamente amarrados com fitas vermelhas. Pela cidade de Jiankang, folhas de bordo flutuavam, no clima fresco e claro do outono. Crianças ainda empinavam pipas; isso imediatamente fazia todos se sentirem felizes e relaxados.
Do lado de fora de cada casa, mesas estavam dispostas repletas de arroz glutinoso, doces fritos e bolos de flores, prontos para que os transeuntes pudessem se servir livremente. Xiang Shu caminhava nem muito rápido nem muito devagar, mas então, parou de repente e perguntou a Chen Xing: “Isso é para as pessoas comerem ou para adorar os deuses?”
Finalmente, Xiang Shu quebrou o silêncio e começou a conversar com Chen Xing. Caminhando lado a lado, Chen Xing explicou: “Já foi usado para adorar os deuses. Depois de ser usado para adorar os deuses, colocam tudo aqui para as pessoas comerem. Quer experimentar? Vou pegar um para você.”
“Não”, disse Xiang Shu. “Não como doces.”
Chen Xing comeu um ele mesmo e então deu outro para Xiang Shu. Desta vez, o aroma de osmanthus estava perfeito; o bolinho estava claro e translúcido. Xiang Shu franziu a testa e resmungou: “Comida de criança.” No entanto, diante do bolinho oferecido por Chen Xing, ele virou a cabeça para evitar seu olhar e então comeu em uma única mordida.
Chen Xing perguntou: “Para onde você quer ir?”
“Não quero ir a lugar nenhum”, disse Xiang Shu casualmente. “Só passeando. É hora de wei*, por que você ainda não voltou?”
(n/t: *hora de wei: entre 13hrs e 15hrs pm)
Chen Xing imitou o tom de Xiang Shu e disse: “Eu quero celebrar o festival junto com você. Tem algum problema?”
Xiang Shu: “…”
◈ ◈ ◈
Quando os dois chegaram ao mercado, viram que o local estava fervilhando de animação e barulho; não era exagero nenhum dizer que se equiparava ao Festival do Outono em Chi Le Chuan. Estudiosos e pessoas comuns de Jiankang haviam todos saído; alguns vendiam pipas, outros procuravam por rouge. Chen Xing imediatamente ficou curioso e foi ver a barraca que vendia figuras de açúcar, enquanto Xiang Shu observava de lado com uma expressão fria.
Ao lado da barraca de figuras de açúcar, havia lojas vendendo xícaras de porcelana, bem como artigos recuperados do Norte e do Sul, produtos secos, caixas de madeira e esculturas. Chen Xing olhou para eles um por um, então examinou minuciosamente aquele que vendia pinturas.
“Quer comprar alguma coisa?” Chen Xing perguntou, virando-se para Xiang Shu atrás dele.
Xiang Shu originalmente pensou que Chen Xing ia comprar algo e já estava pretendendo tirar algum dinheiro do bolso. Quando viu que Chen Xing segurava uma garrafa de vinho e a examinava cuidadosamente, disse: “Não.”
Chen Xing perguntou: “Quer experimentar este vinho?”
Xiang Shu respondeu: “Não quero beber.”
Chen Xing observou Xiang Shu, que permanecia em silêncio — até mesmo passeando pelo mercado, sua atitude era distante e reservada. Ele pensou: Como alguém pode ser tão chato? O Festival de Outono é tão interessante! Como é possível conseguir ser tão entediante no meio do movimentado Mercado das Folhas de Bordo? Me explica isso!
“O que você acha de Jiangnan?” Chen Xing perguntou.
“Entediante”, Xiang Shu respondeu.
Chen Xing perguntou: “E você veio mesmo assim?”
Xiang Shu respondeu com outra pergunta: “Não foi você que quis vir?”
As palavras de Chen Xing foram assim rebatidas. Ele sabia que, no fundo, Xiang Shu devia estar achando Jiankang realmente interessante. Então pegou um tamborzinho de brinquedo de uma barraca à beira da estrada e, chacoalhou-o algumas vezes, agitando-o na frente do rosto de Xiang Shu, e depois o colocou de volta, dizendo para si mesmo: Você só não quer mostrar suas expressões de surpresa e interesse, para evitar que eu fique arrogante e diga que Jiankang é melhor que Chi Le Chuan.
Xiang Shu viu o tambor de mão e franziu levemente a testa. Chen Xing percebeu que ele estava pensando no Tambor Zheng.
De repente, Chen Xing disse: “Naquele dia, ouvi você me chamar de Xing’er.”
Xiang Shu disse com indiferença: “Quando?”
Chen Xing: “Naquela noite em Kuaiji.”
Lembrando de Wu Qi e daquele casal, Chen Xing se sentiu um pouco perdido. Xiang Shu viu a expressão frustrada no rosto de Chen Xing e disse: “Eu não te chamei assim.”
Chen Xing: “Eu ouvi! Mas como você sabia que ‘Xing’er’ é meu apelido de infância? Só meus pais e meu Shifu me chamavam assim. Nem mesmo Yuwen Xin nunca me chamou assim antes.”
Xiang Shu: “Ah, é? Era assim que seu Shifu normalmente te chamava? Guwang não sabia.”
Chen Xing: “Não finja que não sabe… Hm? O que é aquilo?”
Xiang Shu seguiu a linha de visão de Chen Xing e viu que, na rua, muitos jovens e moças estavam de mãos dadas, e cada um deles usava uma pulseira de cordão vermelho no pulso com uma concha marinha entalhada. As conchas tinham formas diferentes, grandes e pequenas, mas todas formavam pares.
Xiang Shu então perguntou a uma transeunte: “Onde conseguiu o acessório na sua mão?”
A jovem sorriu para Xiang Shu e respondeu: “Outra pessoa me deu.”
Chen Xing: “?”
Parece que todo mundo está usando esta pulseira hoje, é para afastar espíritos malignos? Chen Xing observou por um momento e então viu dois homens bonitos de mãos dadas, examinando pedras de tinta e tinta em uma barraca. Seus pulsos também estavam adornados com o cordão vermelho enfeitado com conchas.
“Isso também é um presente? Parece muito bonito”, Chen Xing pensou em voz alta.
Xiang Shu se dirigiu àquela pessoa e perguntou: “Onde vocês dois conseguiram as conchas?”
Os dois homens se viraram e olharam para Xiang Shu e Chen Xing. Um deles era Xie Shi, que disse com um sorriso: "Oh, são vocês?"
“Alguém me deu”, o outro jovem levantou a mão para mostrar a pulseira a Chen Xing.
Chen Xing: “Que lindo! Por que as pessoas estão usando isso no Festival de Outono?”
Xie Shi limitou-se a sorrir, seu rosto levemente corado, e respondeu: “Peça para alguém lhe dar.” Dizendo isso, puxou o jovem, virou-se e foi embora acenando.
Chen Xing: “???”
Xiang Shu deu de ombros, incapaz de insistir no assunto. Sem outra opção, Chen Xing percorreu o mercado. A margem do Rio Huai estava coberta de folhas de bordo, e também havia barqueiros levando jovens casais para passeios de barcos. Muitas pessoas compravam lanches e sentavam-se sob a ponte para comer, aparentemente esperando por algo. À distância, um palco foi montado à beira do rio; as pessoas lá começaram a apresentar uma ópera, narrando Zhijinwu¹, a história sobre Lu Xiu e Yin Lihua².
“Se eu fosse ser um oficial, gostaria de ser um zhijinwu; se eu fosse me casar, gostaria de me casar com Yin Lihua…” Chen Xing recitou, sorrindo.
Xiang Shu ficou de pé na margem do rio, onde havia menos pessoas, e observou o palco distante com as folhas de bordo caindo ao redor entre eles. Chen Xing explicou a história de Lu Xiu e Yin Lihua para ele, e os dois se sentaram à beira do rio, ouvindo por um tempo. Enquanto falava, Chen Xing notou que Xiang Shu estava um pouco distraído; isso o fez pensar: Xiang Shu provavelmente não tinha muito interesse por essas coisas. Ele falava com tanto entusiasmo toda vez, sem nunca ter percebido que, na maioria das vezes, Xiang Shu apenas ouvia por educação. Reconhecendo a discreta falta de interesse, Chen Xing deixou o assunto morrer suavemente.
“Por que parou de falar?” Xiang Shu perguntou, estranhando o silêncio.
“Esqueci o que ia dizer”, Chen Xing respondeu, com pouco interesse. Após um momento, mudou de assunto: “O que você acha de Murong Chong—”
Xiang Shu ficou realmente impaciente desta vez.. “Você pode não mencionar o assunto dos exorcistas? Eu vim curtir o festival hoje para relaxar.”
Chen Xing só pode dizer: “Tá bom.”
Xiang Shu: “Você tem alguma outra coisa em mente além desses assuntos?”
Chen Xing respondeu, resignado: “Nada. Então a pessoa chata na verdade sou eu.”
Os dois ficaram em silêncio por um momento, até que Chen Xing cedeu, deixando escapar um sorriso.
“Tem algo para comer?” Chen Xing disse, mudando de assunto. “Deveríamos ter trazido algum lanche.”
Xiang Shu se levantou e se afastou sem dizer uma palavra. Chen Xing imaginou que ele foi comprar algo quente para comer e resolveu não acompanhá-lo. Pouco depois, sob uma árvore de bordo, avistou um guqin de cinco cordas deixado sobre um pano, cujo dono parecia ter sumido — talvez fosse assistir à ópera. Curioso, Chen Xing pegou o qin e o colocou no colo para testar algumas notas e descobriu que era, na verdade, um guqin de valor inestimável.
Que riqueza… Chen Xing pensou. Deixar um instrumento que vale centenas de taéis de prata simplesmente jogado no chão, sem nenhum cuidado. E assim, ele dedilhou as cordas; produzindo uma sequência de notas de maneira muito suave, semelhante a nuvens se movendo e água fluindo.
◈ ◈ ◈
Xiang Shu comprou baozis envoltos em folha de lótus e shaojiu em uma barraca, e quando voltou para a ponte perto do rio, de repente ouviu uma melodia familiar. Era aquela que ele tinha tocado no topo da torre de Karakorum naquele dia, quando se despediu do povo da Antiga Aliança Chi Le, a que ele tocou usando sua flauta Qiang, a Melodia Fusheng. Ele só ouviu que o som do guqin era intermitente, como se o intérprete não se lembrasse claramente da mudança de tom e da partitura. Mas depois de modificar as cordas várias vezes, tornou-se muito mais suave do que a ressonante flauta Qiang.
Xiang Shu: “…”
Da ponte onde Xiang Shu estava, ele viu que, à distância, Chen Xing estava sentado na margem do rio. Ele tinha um guqin no colo, e folhas de bordo flutuavam ao seu redor. Ele dedilhava as cordas de maneira séria; isso realmente fazia parecer uma cena de tirar o fôlego.
Depois de um tempo, a Melodia Fusheng terminou. Xiang Shu virou e desceu da ponte, apenas para ouvir uma melodia que nunca tinha ouvido antes vindo de sob o bosque de bordo perto do rio.
No início, a melodia era cheia de solidão e desolação; o som era esparso e isolado. Mas então, a corda foi dedilhada de maneira urgente, rodada após rodada, como o som de uma explosão de uma cortina de pérolas de prata no céu, para depois ecoar como martelos pesados batendo no chão.
O som do guqin se acelerou. Em um instante, uma rajada de vento soprou e, junto com as folhas de bordo que enchiam o céu, abriram um novo panorama: águas nebulosas se estendendo à distância, cadeias de montanhas perdendo-se no horizonte, aves migratórias cruzando o Sul e retornando ao Norte. O som do guqin era suave, mas entrelaçado a isso havia uma melodia que revelava a grandiosidade das montanhas e do mar.
Xiang Shu ficou levemente fascinado por um momento. Quando Chen Xing percebeu que ele estava atrás dele, parou de tocar o qin e se virou, dizendo: “Você comprou alguma coisa? Estou morrendo de fome.”
“Que música é essa?” Xiang Shu perguntou.
“Voltando para Casa³”, respondeu Chen Xing. “É de Tao Qian. Não sei se ele veio ao festival hoje. O que você comprou? Não disse que não bebe?”
“Só um pouco”, disse Xiang Shu. “Você fica bêbado fácil.”
Naquele momento, o dono do guqin voltou — era Wang Xizhi, acompanhado de sua família. Ambos os lados trocaram cortesias e falaram agradavelmente, Xiang Shu tinha aquela expressão muito impaciente no rosto e, assim que terminaram de comer, Chen Xing puxou-o pela manga para irem embora.
“Você gosta daquela melodia?” Xiang Shu perguntou de repente.
“É muito agradável de ouvir”, disse Chen Xing, “mas só quando você tocou na sua flauta Qiang. Como você aprendeu a tocar flauta? Eu queria te perguntar antes.”
Xiang Shu respondeu: “Meu pai me ensinou. Vou te ensinar quando tiver tempo. Você sabe tocar zheng⁴?”
Xiang Shu também ficou um pouco surpreso por Chen Xing saber tocar guqin, mas essa surpresa devia ser igual àquela que Chen Xing teve quando descobriu que Xiang Shu realmente sabia tocar flauta Qiang. Era como se o entendimento mútuo entre eles se limitasse a exorcistas e protetores, e nada mais.
“Minha habilidade com o zheng está tão enferrujada”, disse Chen Xing com um sorriso. “Muito ruim, naquela época, eu não levei o estudo a sério.”
Quando os dois cruzaram a ponte, Chen Xing disse: “Quer empinar pipa?”
“Eu te acompanho se quiser empinar”, disse Xiang Shu casualmente.
Chen Xing se sentiu desanimado de novo. “Deixa pra lá.”
Logo após atravessarem a ponte, Xiang Shu lançou um olhar em direção a um vendedor de pipas, mas Chen Xing o impediu de comprar uma. Ao chegarem à margem norte do Rio Huai, depararam-se com um mercado ainda maior — este, (diferentemente daquele do lado de fora do Beco Wuyi que atendia às necessidades da aristocracia), era dedicado exclusivamente ao povo comum. Xiang Shu parou abruptamente, seu olhar percorrendo uma fileira de casas alinhadas à beira do rio, todas convertidas em tabernas e lojas.
“Espere, esta não é a rua que o Banco Dongzhe te deu?” Chen Xing lembrou.
“Hm”, disse Xiang Shu. “É tudo meu agora.”
Nesse momento, Chen Xing descobriu que Xiang Shu já havia se tornado um grande magnata de Jiankang. Ele perguntou: “O que você quer fazer?”
“Nada”, disse Xiang Shu. “Eu originalmente vim aqui hoje só para ver a reabertura dos negócios após os reparos; o resto pode deixar para depois.”
“Depois?” Chen Xing disse com um sorriso. “Você quer morar aqui?”
Xiang Shu olhou para Chen Xing e não disse nada. Chen Xing tinha vontade de dizer "Quem disse que Jiangnan era chato um momento atrás?", mas pensando melhor, Xiang Shu também era meio han, e desde que visitaram Kuaiji, descobriram sobre as origens de sua família. Jiangnan também era sua terra natal, então por que ele não poderia morar aqui?
Chen Xing: “Você vai me convidar para sua casa?”
Xiang Shu disse: “Se você quiser.”
Quando as duas pessoas caminharam pela longa rua, de repente viram muitos vendedores ambulantes na calçada levantando suas varas de bambu; penduradas nas varas estavam aquelas conchas combinando de origens desconhecidas que Chen Xing tinha visto antes!
“Ah, é esta coisa!” Chen Xing disse. “Quanto custam? Por que todo mundo está usando?”
O vendedor ambulante explicou com seriedade: “Vai levar dois? Você pode dar para uma garota ou seu amante…”
Chen Xing: “…”
Então era por isso! Todos diziam que “ganharam de alguém”!
Chen Xing já segurava um cordão na mão; ele não poderia simplesmente devolvê-lo. No entanto, se ele comprasse, para quem daria? Além disso, ele não tinha dinheiro consigo.
O vendedor ambulante acrescentou: “Isso se chama conchas da lua. Só podem ser encontradas na praia durante as noites de lua cheia. Senhores clientes são ambos do Norte? Durante o Festival das Divindades, nós compramos e presenteamos nossos amados; é um par combinando…”
“Ah, entendo”, Chen Xing pensou por um momento. Segurando aquele cordão vermelho, ele involuntariamente olhou para Xiang Shu.
Xiang Shu deu de ombros e deu ao vendedor algumas moedas de prata. O vendedor queria devolver o troco, mas Xiang Shu disse: “Fique com o troco, levarei dois cordões.”
De repente, o coração de Chen Xing acelerou descontroladamente. Ele segurava uma das pulseiras — que formava um par perfeito com a que Xiang Shu tinha. O vendedor, feliz com a generosa gorjeta, abençoou alegremente: “Muito obrigado, senhores! Que seu relacionamento dure para sempre!”
Ele vai me dar uma? Chen Xing só conseguia pensar que a felicidade veio rápida e repentina demais, e sua mente explodiu com tontura. No entanto, ele só viu que Xiang Shu, que caminhava à sua frente, olhou para ele por cima do ombro.
Xiang Shu: “?”
Chen Xing olhou para o cordão vermelho em sua mão. Após um breve momento de perplexidade, seguiu Xiang Shu.
Ele observou Xiang Shu guardar sua pulseira dentro das vestes, próximo ao peito. Um tanto desnorteado, Chen Xing segurou sua própria pulseira enquanto retornavam à ponte. Xiang Shu nunca chegou a lhe oferecer a sua. Após um tempo, Chen Xing também guardou o cordão.
“Você não vai usar?” Xiang Shu perguntou.
“Deixa para lá”, Chen Xing disse com um sorriso.
Os dois ficaram na ponte, observando as águas do rio fluírem. Chen Xing perguntou: “Xiang Shu, para quem você quer dar isso?”
Xiang Shu não respondeu. Chen Xing disse: “Guarde por enquanto, então. Mais tarde, você pode dar para a pessoa que você gosta.”
Xiang Shu respondeu com um “Hmm” distraído enquanto as folhas de bordo flutuavam rio abaixo. Chen Xing perguntou: “Que tipo de pessoa você espera ter ao seu lado no futuro?”
Xiang Shu levantou a cabeça, observando a cor do céu, mas não respondeu. Ele disse: “Está escurecendo. Vamos voltar?”
Chen Xing sabia que, quando Xiang Shu não queria falar sobre algo, não adiantava insistir — qualquer tentativa só levaria a desconforto. Então, mudou de assunto: “Espera, o que está acontecendo ali?”
O céu escurecia gradualmente, e mais pessoas se aglomeravam às margens do rio, onde inúmeras lanternas flutuantes dançavam suavemente na superfície da água. Chen Xing disse: “Vou dar uma olhada no que estão fazendo e já volto.”
Xiang Shu o seguiu pela ponte abaixo. Após o anoitecer, o mercado gradualmente fechou, e os cidadãos de Jiankang se reuniam às margens do Rio Huai. Novas barracas surgiram, vendendo lanternas de papel. Chen Xing perguntou e então soube que, após o Desastre de Yongjia, na noite da Divindade do Outono, havia uma tradição não oficial em Jiankang: soltar uma lanterna flutuante no Rio Huai, em memória dos entes queridos falecidos.
“Vou comprar uma lanterna também”, disse Chen Xing. “Tantas pessoas morreram por minha causa.”
Xiang Shu disse: “Então você tem que comprar todas as lanternas de rio desta barraca.”
Chen Xing suspirou. “Sim.”
Xiang Shu pretendia provocar Chen Xing; ele não esperava que Chen Xing não percebesse a ironia. Ele não pôde deixar de dizer: “Até agora, você ainda se culpa?”
Chen Xing sorriu. “Eu sei que não devia, mas não consigo evitar.”
Xiang Shu, sem alternativa, comprou todas as lanternas da barraca. Pegou emprestado um isqueiro de bambu, acendeu uma vela e começou a acender as lanternas para Chen Xing na margem do rio. Chen Xing, por sua vez, as soltou uma após outra na água: pelo cocheiro e pelo povo de Chang'an, pelo Rei Akele e sua Consorte, pelos Xiongnus que morreram nas mãos de Che Luofeng, pelo povo Hu de Chi Le Chuan… por Wu Qi e Zheng Lun, de Kuaiji.
“Você quer acender uma para Che Luofeng?” Chen Xing perguntou.
Xiang Shu disse: “Acenda primeiro para sua família.”
Chen Xing pegou a lanterna, inclinou-se sobre a água e soltou a última delas. Quando se endireitou, avistou Feng Qianjun e Gu Qing não muito longe, curvados para soltar sua própria lanterna.
Xiang Shu assobiou para o grupo à distância. Para sua surpresa, Xiao Shan também estava lá, sentado em um barco. Xie Daoyun remava, acompanhada por outro homem, enquanto passavam sob a ponte. Xiao Shan ajoelhou-se na proa e soltou uma lanterna — provavelmente para Lu Ying.
“Eles estão ali”, Chen Xing fez um sinal para Xiang Shu olhar.
Xiang Shu respondeu com um “hm” e, por trás de Chen Xing, colocou a última lanterna, aquela em suas mãos, no rio.
Chen Xing avistou alguém na margem oposta acenando para eles. Inicialmente não reconheceu a pessoa, mas quando o homem colocou a lanterna perto de seu rosto, a luz o iluminou —— era Bi Hun! Bi Hun estava inesperadamente em Jiankang também.
Chen Xing acenou de volta e perguntou a Xiang Shu: “Lembra dele?”
“Lembro”, respondeu Xiang Shu calmamente. “O oficial militar que guarda Kuaiji, o amante dele morreu.”
Chen Xing disse com seriedade: “Xiang Shu, você sempre pensa que eu vivo como se não tivesse senso de identidade, e me pede para não usar a Lâmpada do Coração, com medo de que eu morra. Muitas vezes digo que não tenho escolha, que só posso aceitar o que o Céu preparou para mim. Talvez eu ainda me sinta inconformado com isso. Mas, ah, veja, neste momento…”
Bi Hun soltou sua lanterna na água. Chen Xing não pôde evitar levantar as mãos, e nelas, a Lâmpada do Coração emitiu uma luz brilhante. Por um momento, todas as pessoas em ambas as margens do rio olharam para ele.
Chen Xing olhou em silêncio para eles, para o povo da Terra Divina, que fervilhava de felicidade, raiva, tristeza e alegria —— e ele também não era diferente daquelas “pessoas”.
Ele levantou lentamente a mão direita e a colocou na frente dele, e usando uma mão, realizou um truque de mágica para todos, que era na verdade aquele “selo da lâmpada" que ele aprendeu desde pequeno.. Era acender a lâmpada para brilhar gloriosamente pelas quatro planícies, dissipando a escuridão e iluminando todos os lugares, e pretendia mostrar que nesta noite escura, ele jamais pararia de lhes dar a força para sustentar sua fé.
Seus cabelos ondulavam suavemente na brisa noturna e, com os olhos fechados, a luz brilhante iluminava seu rosto.
“Eu realmente acho”, Chen Xing sorriu ao dizer, “independentemente do porquê e de quanto eu tenha que pagar, ao vê-los, eu ainda estou muito disposto a fazer isso.”
Xiao Shan, Feng Qianjun, Gu Qing, Xie Daoyun, Bi Hun… e todos os outros, bem como o povo às margens do Rio Huai, pareciam entender o que Chen Xing estava tentando dizer, milhares de pessoas olharam para a cintilante Lâmpada do Coração e, um após o outro, seguiram Chen Xing e fizeram aquele gesto de “truque de mágica” de acender a lâmpada.
Xiang Shu ficou em silêncio por um momento, mas então, junto com todos os outros, ele se virou e encarou Chen Xing. Sua mão direita estava “acendendo” a lâmpada, e refletido em seus olhos, estava Chen Xing banhado naquela luz brilhante e pura.
O som de cascos de cavalo ecoou; Xie An cavalgou seu cavalo, cruzou a ponte do Rio Huai e desceu até a margem do rio.
Chen Xing e Xiang Shu deixaram a margem do rio. Bi Hun aproximou-se, prestes a cumprimentá-los, quando Xie An parou seu cavalo à beira do caminho e disse: “Finalmente encontrei vocês. Tenho notícias, mas não sei se são boas ou ruins, Pequeno Shidi.”
Chen Xing ficou levemente perplexo, mas Xie An continuou: “Acabo de ser informado de que, três dias atrás, Murong Chong e Wang Ziyue entraram em conflito em Chang’an. Wang Ziye está morto.”
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Notas:
1 执金吾 (Zhí jīnwú), literalmente traduzido como “aquele que detém o cobre, significando autoridade”. É um antigo título oficial para o responsável por manter a lei e a ordem na capital.
2 Lu Xiu foi o fundador da Dinastia Han Oriental e Yin Lihua foi sua primeira esposa (e sua namorada de infância), embora tenha rejeitado o título de imperatriz a princípio e vivido como consorte imperial até a deposição da primeira imperatriz. Leia mais aqui: Yin Lihua
3 Uma peça qin cuja letra era originalmente um poema escrito por um escritor (e poeta) da Dinastia Jin, Tao Qian. Descrevia uma casa para a qual um oficial retornava após se aposentar de verdade. Leia mais aqui: Gui Qu Lai Ci
4 筝 (zhēng), guzheng ou cítara longa; cítara longa com 13 a 16 cordas, desenvolvida a partir do guqin (古琴) durante os tempos Tang e Song.
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Flor: Chen Xing! Ela já te deu a pulseira, por que não nota que ele te ama?!
Juro, queria muito ver a versão do monólogo do Xiang Shu, só pra saber o que ele pensa T-T
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