sábado, 1 de abril de 2023

[Novel] Tianbao Fuyao Lu - Capítulo 018

     


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Tradução: Foxita
Revisão: Miss Sw
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Capítulo 18 – Palácio Beijiao



O Departamento de Exorcismo agora tinha adquirido o hábito de cochilar por toda a tarde, saindo para cumprir as missões à noite, ou, em outros termos, trocaram o dia pela noite. Durante o dia, não conseguiam parar de bocejar, nem mesmo Hongjun, mas quando dava umas nove e meia da noite, todos ficavam bem-dispostos.
Qiu Yongsi e Hongjun estavam sentados no telhado, pois dali podiam ver todo o Exército Longwu. A-Tai sentava-se do lado de fora do quarto de Hu Sheng, vigiando-o, enquanto Mo Rigen permanecia agachado junto à parede do quintal ao lado do quarto.
À noite, as luzes das lanternas do quarto de Hu Sheng ainda estavam acesas. Os quartéis do Exército Longwu abrigavam muitos soldados e, embora Hu Sheng tivesse um imóvel na cidade, ainda mantinha o hábito de viver e comer com seus subordinados. Esta noite, as coisas não estavam como de costume e ele parecia apreensivo em relação a algo. Ele andava de um lado para o outro em seu quarto, olhando vez ou outra para a jaula coberta de talismãs.
“De onde você veio?”, apesar de Hu Sheng não acreditar que a raposinha fosse Jin Yun, notou que os ferimentos dela eram profundos, o que era realmente um pouco lamentável.
A raposinha respondeu, “Comandante Hu, me solte.”
Hu Sheng soltou um “ahh” cheio de pânico.
Do lado de fora, Mo Rigen e A-Tai ouviram o grito, mas quando estavam prestes a entrar no quarto, Li Jinglong apareceu no pátio e gesticulou para que não o fizessem, pois estava tudo bem.
“Esperem aqui,”, falou Li Jinglong em voz baixa. “A não ser que ela fuja, não ajam de maneira precipitada.”
Após dizer isso, Li Jinglong deu um salto voador na parede e correu para uma área mais elevada.  
“Você-você-você... você pode falar?”, Hu Sheng parecia estar em uma espécie de transe. Do lado de fora, um guarda do Longwu bateu à porta, perguntando, “Comandante Hu?”
Hu Sheng se apressou em garantir que não havia nada de errado, dispensando o guarda e voltando a olhar atentamente para a pequena raposa. Os olhos dela estavam cheios de lágrimas quando falou com a voz baixa, “Comandante Hu, eu sei que você me tratou bem e eu também cheguei a pensar que... se eu não fosse um yao...”
“Você-você-você...” Hu Sheng continuava a recuar, os olhos cheios de pavor. 
“Minhas duas irmãs e eu estávamos originalmente cultivando em Xingyang", a raposinha chegou um pouco mais perto da lateral da jaula e prosseguiu em voz baixa. “Eu só queria ver um pouco mais da sociedade humana, então a irmã mais velha e a segunda irmã me trouxeram para Chang’an. Nós nunca machucamos qualquer pessoa, não podíamos contar com ajuda de ninguém e só nos restou morar em Pingkang Li. Nunca iríamos imaginar que Li Jinglong não nos deixaria em paz...”
“Aquele tratante[1] não mentiu para mim", falou Hu Sheng apavorado. “Você realmente é um yao!”
“Comandante Hu!”, falou a yao raposa. “O Budismo nos ensina que humanos virtuosos receberão bom carma. Se me soltar, mesmo que leve uma vida inteira, retribuirei essa dívida gigantesca. Você ainda se lembra da história que contei quando nos conhecemos?”
Hu Sheng respirou fundo, finalmente se acalmando. Quando a raposa falou aquilo, ele se lembrou do Festival dos Fantasmas há três anos, quando conheceu Jin Yun enquanto soltava lanternas na Ponte Qushui[2]. Naquela noite, Jin Yun lhe contou uma história sobre uma yao raposa e um erudito que, apesar de suas semelhanças, em razão de seus diferentes caminhos da vida, acabaram tragicamente arruinados. 
Os olhos de Hu Sheng se encheram de compaixão. Desde pequeno ele ouvia histórias comoventes como aquela, mas os eventos que aconteciam bem diante de seus olhos ainda lhe pareciam um tanto suspeitos.
Li Jinglong saltou sobre o telhado, onde Hongjun e Qiu Yongsi conversavam aos cochichos. Assim que o viram, pararam imediatamente.
Li Jinglong olhou desconfiado para os dois, pois ambos agiam de maneira suspeita. Na verdade, neste exato momento Hongjun consultava Qiu Yongsi sobre as coisas que geralmente aconteciam em Pingkang Li — como um jovem de dezesseis anos, ele estava em sua fase fogosa e tinha muita curiosidade sobre tudo. Quanto mais Li Jinglong dizia para Hongjun parar de fazer perguntas, mais ele queria saber os detalhes, então Qiu Yongsi baixou bastante a voz e contou-lhe tudo, todos os sórdidos detalhes. Conforme Hongjun ouvia, seu rosto ficava cada vez mais vermelho.
“Alguma coisa estranha?”, perguntou Li Jinglong. 
“Não, nada", Qiu Yongsi se apressou em responder.
Hongjun, com o rosto corado, também respondeu, “Nada.”
Parecia que os dois estavam esperando Li Jinglong ir embora, mas, ao invés disso, ele se sentou ao lado deles. Hongjun tinha a estranha sensação de que foi pego no flagra e não conseguia parar de se mexer inquieto.
Li Jinglong falou “Agradeço a vocês pelo trabalho duro. Quando este caso for encerrado, deveríamos tirar uma bela folga. Vamos achar um lugar para vocês se divertirem.” 
Li Jinglong olhou para Hongjun e Qiu Yongsi, e Hongjun de repente teve um lampejo de inspiração e disse, “Agora pouco, nós estávamos...”
Qiu Yongsi imediatamente o interrompeu antes que ele pudesse terminar a frase, “... estávamos servindo a nação, como é nosso dever. Como podemos chamar isso de trabalho duro?”
Naquele momento, na escuridão, o chão inchou e uma quilha semelhante a uma espinha dorsal se aproximou do campo de treinamento do Exército Longwu. Quando alcançou a frente do salão principal, ela bateu contra as fundações com um baque surdo e então recuou um pouco, procurando por outro caminho. Deu uma volta e se esgueirou por debaixo da parede que cercava o quintal.
Li Jinglong imediatamente percebeu que havia algo errado e perguntou, “Que barulho foi esse?” 
Hongjun e Qiu Yongsi carregavam expressões de desconhecimento, mas Qiu Yongsi havia sentido aquele leve tremor, então falou, “Agora pouco, parece que alguma coisa tremeu um pouco... lá embaixo”.
Todos sabiam que ali ainda estava a pequena yao raposa, então se concentraram nas paredes, telhados, e lugares desse tipo, mas não esperavam aqueles movimentos na terra abaixo deles.
“Existem yaoguais que podem se deslocar por baixo da terra?”, perguntou Li Jinglong.
Hongjun prontamente pensou em um — o peixe ao[3] que ele havia perseguido por quase vinte li[4] aquele dia!
Depois de ser informado disso, Li Jinglong imediatamente saltou para baixo, dizendo, “Reúnam-se todos no quintal!”
O chão se inchou novamente e uma nuvem de névoa negra emergiu, transformando-se no corpo de um homem alto e magro. Ele vestia um conjunto de roupas pretas e tinha uma ferida em cicatrização na testa. Ele empurrou a porta e entrou.
Com um rangido, a porta do quarto de Hu Sheng se abriu. A porta da jaula estava completamente aberta e ali havia uma mulher com machucados pelo corpo, seu rosto totalmente pálido. Era Jin Yun e, com lágrimas nos olhos, ela colocou Hu Sheng na cama, cobrindo-o com um cobertor enquanto falava em voz baixa, “Comandante Hu, eu realmente sinto muito... eu também não queria...”.
“Você ainda foi capaz de desenvolver sentimentos por ele após lhe fazer companhia”, disse friamente o homem vestido de preto. 
Jin Yun virou bruscamente a cabeça, quase morta de susto, e então franziu o cenho. “Fei Ao?”[5].
Fei Ao respondeu, “Os superiores decidiram, tenho que te levar para longe da cidade de Chang’an imediatamente.”
Jin Yun suspirou e lamentou, “A irmã mais velha e a segunda irmã foram mortas por eles. Seu ferimento está melhor?”
Fei Ao se aproximou e levantou o rosto de Jin Yun pelo queixo ao dizer, “Ninguém esperava que, desta vez, o Departamento de Exorcismo fosse ser um osso tão duro de roer. Só espere, vou vingá-las. Vamos!”.
Jin Yun deu um passo à frente, mas não conseguiu evitar cambalear. Quando Fei Ao viu que ela estava machucada, levantou as mangas e a abraçou. Energia yao emanou da mão esquerda dele em uma corrente constante, que fluiu para a cabeça dela, curando suas feridas. O rosto de Jin Yun lentamente recuperou um pouco de cor.
Os cinco membros do Departamento de Exorcismo estavam espalhados pelo pátio do lado de fora; Mo Rigen, empoleirado no alto do muro, puxava lentamente a corda do seu arco longo e mirava diretamente nas duas silhuetas humanas no quarto.
Qiu Yongsi e Li Jinglong se agacharam do lado de fora da porta, ouvindo a conversa que vinha de dentro.
A-Tai e Hongjun se esconderam nas sombras, um segurando um leque nas mãos e o outro preparando suas três facas. 
“O principal inimigo ainda nos espera, você não deveria desperdiçar seu cultivo comigo,” Jin Yun protestou em voz baixa.
Fei Ao respondeu casualmente “Depois desta noite, iremos para longe e não ficaremos mais em Chang’an. Quando você e eu tivermos cultivado o suficiente, poderemos voltar para nos vingar por suas irmãs.”
Jin Yun de repente sentiu uma insinuação inesperada nas palavras dele e exclamou, “Eles permitiram que viesse para me matar?”
“Enquanto eu estiver aqui, ninguém vai encostar em você", respondeu Fei Ao. 
“E as outras jie[6]?”, perguntou Jin Yun. “Receio que Li Jinglong continuará investigando.”
Fei Ao respondeu “Além do cadáver pelo qual sua segunda irmã se sacrificou, todos os outros foram escondidos sem deixar vestígios. Como ele vai continuar investigando? Vai prendê-las uma a uma e interrogá-las? Depois dos exames do ano que vem, vamos ter a chance de ensinar uma boa lição a Li Jinglong e nos certificar de que ele não tenha um túmulo para se deitar quando morrer! Deixá-lo simplesmente morrer seria muito pouco”.
Ao ouvir aquelas palavras, Qiu Yongsi e Li Jinglong ficaram atordoados. Os olhos de Li Jinglong ainda estavam cheios de horror quando ele levantou a mão para sinalizar para os outros, mas não chegou a baixá-la a tempo.
Naquele exato momento, Fei Ao, ainda abraçado a Jin Yun, já havia aberto a porta e dado um único passo para fora...
Li Jinglong sequer chegou a gritar para que agissem e Mo Rigen, muito rapidamente, disparou uma flecha. Naquele instante, no entanto, Jin Yun já havia sentido o perigo e empurrado Fei Ao para o lado, sendo atingida e caindo no chão com um grito de dor.
“Não o deixem escapar!”, gritou Li Jinglong.
A reação de Fei Ao foi quase imediata; no momento em que Jin Yun foi atingida pela flecha, ele percebeu que aquilo era uma armadilha e correu para fora da porta arrastando Jin Yun com uma mão! Li Jinglong sacou sua espada e Fei Ao subitamente se virou e saltou na direção dele, gritando furiosamente, “Morra!”
Todos se assustaram, com medo de que Li Jinglong não fosse capaz de se defender daqueles ataques. No mesmo instante, flechas e facas de arremesso foram lançadas na direção de Fei Ao, que rugiu com raiva e soltou uma explosão de gotas d'água ao seu redor, que se dispersaram em todas as direções.
Li Jinglong era quem estava mais perto do inimigo e foi jogado para trás pela força da explosão.
Hongjun lançou a Luz Sagrada Pentacromática para bloquear o golpe, protegendo a si próprio e A-Tai, mas quando estava prestes a sair para resgatar Li Jinglong, este chutou um pilar tomando impulso. Levantando sua espada sobre a cabeça com as duas mãos, Li Jinglong urrou com raiva, “É você quem deve morrer! Yao maligno!”
O corpo e a espada de Li Jinglong voaram juntos na direção de Fei Ao. Enquanto o outro balançava a espada para baixo, Fei Ao levantou a mão e, com um “dang”, apanhou a lâmina. Ele puxou a espada, fazendo-a girar e mais uma vez arremessando Li Jinglong para longe como se fosse um boneco de pano.
“Fei Ao, vá embora, rápido... não se preocupe comigo...”, disse Jin Yun, ofegando seus últimos suspiros.
“Eu vou matá-los!”, Fei Ao estava em uma fúria incontrolável e não conseguia parar de arfar.
“Com essas habilidades?”, A-Tai riu friamente.
Naquele instante, Hongjun recolheu a Luz Sagrada. A-Tai abriu o leque dobrável azul e, no exato momento em que Hongjun recolheu a luz, o abanou.
Do chão plano surgiu um tornado que sugou todo o vapor de água liberado por Fei Ao, transformando-se em um furacão que bateu fortemente contra o corpo dele com um grande estrondo. As portas e janelas do quarto de Hu Sheng foram destruídas pela força daquele golpe, mas Mo Rigen permaneceu calmo e disparou três flechas que atingiram firmemente o corpo de Fei Ao. Em resposta, Fei Ao se transformou em um grande peixe em pleno ar e Li Jinglong gritou, “Hongjun! Facas de arremesso!”
Hongjun lançou outra faca e com consecutivos “shua shua shua”, flechas e facas se enterraram no corpo de Fei Ao. 
O gigante peixe ao quebrou a parede traseira do quarto e se afundou na terra, levando consigo a segunda faca de arremesso de Hongjun, enquanto corria para fora do acampamento do Exército Longwu.
Em pouco tempo, todo o Exército Longwu tinha ouvido a confusão e cada um dos soldados acendeu sua própria tocha. Li Jinglong gritou, “Vão atrás dele! Nós não podemos deixá-lo fugir de novo!”
Todos saíram em perseguição através do buraco que o yao havia aberto na parede do pátio e, atrás deles, o quartel estava em alvoroço. Hongjun gritou, “Sigam minha faca!”
Logo em seguida, como naquela noite, o chão inchou e o peixe ao levou a faca de arremesso consigo, enquanto fugia em direção à parte norte da cidade.
“Por favor, não vá para o palácio...”, falou Li Jinglong. “Continuem atrás dele!”
Os membros do Departamento de Exorcismo aceleraram os passos, perseguindo o peixe ao. Hongjun ainda precisava recuperar sua primeira faca de arremesso e, desta vez, jurou que não o deixaria fugir novamente. Ele lançou o gancho, saltando facilmente para os telhados, e Mo Rigen também saltou seguindo atrás dele.
A-Tai abanou novamente o leque, fazendo soprar uma forte rajada de vento, que igualmente o levou até o telhado. Li Jinglong seguia atrás deles e também conseguiu subir com alguns poucos passos.
“Pessoal... esperem por mim!”, gritou Qiu Yongsi. 
Li Jinglong: “...”
Qiu Yongsi ainda estava escalando o muro, mas ele não conseguiu terminar de subir mesmo depois de algumas tentativas, então Li Jinglong teve que voltar e puxá-lo para cima. Naquele momento, os três à frente já tinham sumido sabe-se lá em qual direção e Li Jinglong disparou sem paciência, “Anda logo!”, e continuou a correr em frente.
O peixe ao felizmente evitou o palácio, dirigindo-se mais para o norte da cidade com a faca de arremesso cravada em sua carne.  Hongjun gritou alto, “Ele quer deixar a cidade!  Está saindo do chão!”
“Hongjun! Me joga pra cima!”, gritou A-Tai. 
Hongjun: “?”
O peixe ao estava se movendo muito rápido; ele já havia alcançado o portão noroeste da cidade e Hongjun não tinha tempo para pensar. Ele lançou o gancho e, enquanto se balançava para baixo com ele... A-Tai saltou para fora do telhado, virando-se em pleno ar e estendendo uma mão que Hongjun agarrou firmemente. Usando toda sua força, Hongjun agarrou aquele pulso e, com um arremesso feroz, mandou A-Tai voando pelos ares.
Seguindo de perto, Mo Rigen também saltou, agarrando o pulso de Hongjun e gritando, “Desculpe o incômodo!” 
E, com outra sacudida, Hongjun também jogou Mo Rigen voando em direção à muralha da cidade.
Era tarde da noite, no entanto os guardas da cidade ainda saboreavam os eventos engraçados que aconteceram hoje em Chang’an.
“Fiquei sabendo que Li Jinglong pegou uma raposa e a mandou para o Exército Longwu dizendo que tinha capturado um yao, ha ha ha!”
“Ele ficou louco pensando em como ganhar reconhecimento! Amanhã também vou levar um cachorro...” 
“Que barulho é esse?”
Alguns guardas da cidade ouviram o estrondo perto do chão e os gritos de A-Tai e Hongjun em frente ao portão, então correram para o lado da torre para olhar para baixo.
Li Jinglong e Qiu Yongsi se apressaram.
O peixe ao rompeu o solo, voando para cima. 
O corpo de A-Tai voava em pleno ar quando o peixe ao soltou um grito rouco, voando na direção dele enquanto abria sua boca sanguinolenta. Quando estava prestes a ser mastigado e transformado em pasta de carne, A-Tai puxou o alaúde amarrado às suas costas e falou, “Vai lá pra baixo!”
Dizendo isso, A-Tai ergueu o alaúde barbat e bateu com força no peixe ao.
Todo mundo: “...”
Aquele golpe foi devastador, gerando um enorme estrondo. No momento em o alaúde o golpeou, foi como se uma explosão de ondas sonoras tivesse acontecido, e o peixe ao de quase três zhang[7] de comprimento foi jogado contra a muralha da cidade. Poeira e pedaços de pedra voaram por todos os lados e ele caiu do lado de fora da cidade com um grande baque! 
“Impossível!”, gritou Hongjun. “Você realmente usou o alaúde para bater nele!”
A-Tai: “Hã?”
Mo Rigen riu alto enquanto pisava nos tijolos que voavam. Ele puxou a corda de seu arco, soltando três flechas em sequência nos três olhos compostos na testa do peixe ao. O peixe rugiu de dor e, quando as flechas voaram de volta por conta própria, arrancaram os olhos das órbitas!
Logo em seguida, o peixe ao mergulhou no chão do lado de fora da cidade. Assim que Li Jinglong e Qiu Yongsi correram em direção ao portão, Li Jinglong gritou, “Rápido, abram o portão!” 
Neste instante, vários guardas do portão estavam à beira de um colapso.
Li Jinglong gritou, “Assuntos do Departamento de Exorcismo! Se não abrirem, responderão por isso mais tarde!”
Os guardas se apressaram em abrir e Li Jinglong não tinha tempo a perder com conversa fiada, enquanto arrastava consigo um ofegante Qiu Yongsi para fora da muralha.
“Onde estão os cavalos?”, Li Jinglong olhou ao redor em todas as direções. 
“Onde está o yaoguai?”, das sombras em que se encontrava, Mo Rigen também olhava em todas as direções.
Li Jinglong apontou mais para o norte, indicando que ele tinha fugido naquela direção.
“A-Tai, você é tão forte!”, Hongjun se engasgou de espanto.
A-Tai falou humildemente, “Não, não; eu não sou tão poderoso quanto você, xiaodi".
“Não, não, sua magia é tão poderosa!”, Hongjun estava agora idolatrando A-Tai com toda sinceridade, especialmente aquele golpe com o alaúde.
“Nosso A-Tai é o Arquimago das Regiões Orientais...” Qiu Yongsi se apressou em acrescentar.
“Já chega de você!”, disse A-Tai, “Qiu Yongsi, além de nos assistir fazendo macaquices esses dias, o que mais você fez? Já passou da hora de mostrar um pouco das suas habilidades!”
Qiu Yongsi falou, “Eu realmente não posso...” 
“Parem de conversa mole!”, Li Jinglong falou impaciente. “Venham aqui, achamos os cavalos!”
Mo Rigen e Li Jinglong trouxeram alguns corcéis. Hongjun inicialmente estava desapontado porque o yaoguai fugiria novamente com sua segunda faca, mas quem imaginaria que realmente havia cavalos preparados do lado de fora da cidade?
Todos montaram, seguindo pela estrada enquanto perseguiam o yaoguai. Li Jinglong sacou sua espada, apontando-a para a norte, e ela começou a brilhar.
“Como é que temos cavalos?”, perguntou Hongjun curioso. 
“Eles foram preparados à tarde”, respondeu Li Jinglong. “Norte, sul, leste, oeste; cada um dos quatro portões tinha cavalos a postos.”
Os cavalos de guerra galoparam na noite escura ao longo da estrada para o norte; a espada brilhando cada vez mais forte. O peixe ao tinha sido gravemente ferido, então sua velocidade caiu drasticamente enquanto deslizava pelos campos de trigo já colhidos, correndo em direção às cordilheiras do norte.
“Esta espada realmente pode sentir suas facas de arremesso”. Com uma mão, Li Jinglong segurava as rédeas e, na outra, a espada brilhava intensamente, iluminando o caminho à frente deles.
Qiu Yongsi disse, “Talvez sejam feitas do mesmo material. Armas mágicas da mesma origem frequentemente têm efeitos ressonantes”.
Todos pararam seus cavalos em frente ao Palácio Daming e Li Jinglong ficou bastante aflito com aquele desenrolar de acontecimentos. Sua testa se enrugou em um nó, mas a luz no corpo da espada estava firme como nunca — o yaoguai havia entrado no Palácio Daming.
"Vamos invadir?”, Mo Rigen perguntou.
“Vamos invadir", falou Li Jinglong.
Hongjun lançou seu gancho, escalando o muro de vários zhang de altura que cercava o palácio, e todos o seguiram para entrar sorrateiramente.
Ainda que o Palácio Daming fosse um dos palácios residenciais de Li Longji[8], era muito menos favorecido que o Palácio Xingqing. Li Longji raramente vinha até aqui, pois ficava fora dos limites da cidade de Chang’an e apenas algumas centenas de criados tomavam conta dele. Li Jinglong fez um gesto para que todos os seus subordinados o seguissem e eles rapidamente se esgueiraram em direção aos corredores.
As pessoas no palácio já estavam há muito tempo adormecidas e um fino brilho de luar iluminava o lugar, transformando-o em uma imagem pura e melancólica.
O corpo da espada ficou cada vez mais brilhante e o vento de outono soprou através das leves cortinas, enquanto gritos entrecortados vinham do pátio aos fundos.
Fei Ao agarrou-se à raposinha morta e se ajoelhou no pátio com o coração entristecido, deixando escapar soluços roucos.
“Por que você... morreu assim...”, soluçou Fei Ao.
Quando ouviu aquele choro, Hongjun sentiu um nó na garganta[9]. Mo Rigen pareceu perceber seu sentimento e pressionou gentilmente o ombro alheio com a mão.
Li Jinglong falou em voz baixa, “Daqui a pouco, por favor, usem suas melhores técnicas, não as escondam mais. Principalmente você, Qiu Yongsi.”
Qiu Yongsi pôde apenas sorrir um pouco.
“E tentem mantê-lo vivo”, acrescentou Li Jinglong. “Precisamos levá-lo de volta e interrogá-lo para acabar com nossos inimigos o mais rápido possível. Não façam muito estrago.”
Todos soltaram um “hum” em concordância, enquanto Li Jinglong refletia novamente sobre algumas questões. Aquele era, afinal, um ser não-humano, e se ele machucasse humanos, isso seria ainda pior. Então emendou, “Bem, façam o que tiverem que fazer e esqueçam o que acabei de dizer.”
Logo em seguida, ele fez um gesto com a mão e todos se dispersaram, espalhando-se pelos quatro cantos do pátio posterior.
Li Jinglong levantou sua espada e andou em direção ao pátio. Hongjun, Mo Rigen e o restante deles assistiu ansiosamente Li Jinglong. Hongjun franziu o cenho pensando; toda vez era Li Jinglong quem ia atrair os inimigos, o que era realmente muito perigoso.
A faca de arremesso de Hongjun estava presa às costas de Fei Ao, ainda emanando raios de luz brilhantes.
Li Jinglong parou a dez passos de distância de Fei Ao, ficando de frente para ele naquele pátio espaçoso.
“Vamos", falou Li Jinglong. “No ponto em que as coisas chegaram, não há mais o que conversar.” 
Fei Ao respondeu com a voz rouca, “Li Jinglong, deixe-me adivinhar, existe alguém de quem você gosta? Quem é a pessoa que você ama?”
Li Jinglong ficou em silêncio, seus olhos acompanhando atentamente cada movimento de Fei Ao.
Fei Ao falou novamente com a voz rouca, “Se você não me matar hoje, no futuro vou morder toda a carne dos ossos da sua amada, um cun[10] por vez. Vou arrancar a pele dela, de pouquinho em pouquinho, e vou rasgar os nervos dela um por um.”
“Haverá um dia em que usarei os tendões dela para quebrar seu pescoço”. Fei Ao levantou a cabeça e, quando ele olhou para Li Jinglong, Hongjun, que assistia atentamente à distância, não conseguiu evitar tremer um pouco. Esta foi a primeira vez que ele viu tamanho ódio e hostilidade nos olhos de um yao; parecia até que ele estava prestes a disparar energia negra. 
Fei Ao abriu a boca e seu rosto de repente ficou deformado, revelando uma boca cheia de dentes afiados! Li Jinglong agarrou firmemente sua espada e respondeu, “Que pena, acho que você não vai viver pra ver esse dia.”
Fei Ao prometeu roucamente, “Mesmo que eu morra hoje nas suas mãos, alguém vai me ajudar conseguir essa vingança sangrenta!”
“Vão!”, Qiu Yongsi gritou de repente.
Ninguém esperava que, antes mesmo de Li Jinglong dar uma ordem, Qiu Yongsi seria o primeiro a abrir a boca! 
Hongjun também temia que Li Jinglong não conseguisse se defender do golpe desesperado de Fei Ao, então lançou uma faca de arremesso com um "shua"! Conforme esperado, incontáveis dentes afiados e brilhantes dispararam para fora da garganta de Fei Ao e Li Jinglong inclinou-se para trás, recuando. A faca de arremesso varreu horizontalmente, bloqueando os dentes perversamente afiados que voaram como uma tempestade de pétalas de flores na primavera!
A faca arremessou aqueles dentes afiados para o lado, fazendo-os voarem em todas as quatro direções com uma série de estampidos.
Hongjun gritou, “Li Jinglong!”
Desta vez, Li Jinglong estava bastante preparado; ele rapidamente jogou o corpo para trás, para evitar ser novamente pego por Fei Ao enquanto todos liberavam seus ataques – mas, na verdade, Fei Ao havia feito um movimento em falso, virando-se e correndo para o corredor dos fundos do Palácio Daming! 
Naquele instante, Mo Rigen enviou suas Sete Flechas Cabeça-de-Prego[11] de uma vez, que viraram em pleno ar e seguiram Fei Ao palácio adentro.  Hongjun e A-Tai já tinham saído correndo atrás dele.
“Esperem!”, Li Jinglong quis gritar, mas Qiu Yongsi falou em voz alta, “A arma mágica de Hongjun é a mais indicada para lutar, não precisa se preocupar com ele. Vamos, chefe!”
Li Jinglong, Qiu Yongsi e Mo Rigen seguiram imediatamente. A porta de madeira, que fora antes destruída pelo peixe ao, foi agora atingida por algo desconhecido, emitindo um alto estrondo. Logo em seguida, A-Tai, o leque em uma mão e, na outra, os anéis brilhando simultaneamente com vermelho, azul, amarelo e verde intensos, bateu a palma da mão no chão.
Com um estrondo, o chão começou a tremer e toda a parte dos fundos do palácio pulou do chão devido à magia de A-Tai! 
O peixe ao não tinha como mergulhar novamente no solo, então virou a mandíbula na direção de A-Tai para mordê-lo. Porém, naquele exato momento, Hongjun já havia entrado na frente de A-Tai e bloqueado. Com um movimento, a Luz Sagrada Pentacromática desviou o golpe como se fosse um poderoso escudo impenetrável! No instante em que aquele golpe foi desferido, Hongjun urrou com raiva, “Cai fora, porra!”
Assim que o peixe se chocou contra a Luz Sagrada Pentacromática, houve uma explosão de energia que o jogou diretamente para trás!
O enorme peixe ao tombou no meio do corredor, derrubando diversos móveis e peças de cerâmica. A confusão alertou os guardas do lado de fora, que vieram correndo para averiguar o que estava acontecendo. O lugar se encheu de gritos.
“Pessoal, vocês...”, Li Jinglong correu para o corredor e, ao ver aquela bagunça pelo chão, se perguntou quanto dinheiro teriam que pagar para compensar. Ele gritou apressado, “Atraiam-no para lutar lá fora!” 
“Vou fazer o possível!”, gritou Hongjun e disparou na frente, Mo Rigen seguindo-o atrás. Enquanto corria, ele invocou de volta as Sete Flechas Cabeça-de-Prego com um movimento ágil de mão. Recolhendo-as em um monte, colocou-as todas no arco, onde emitiram milhares de raios de luz.
Com uma mão, Hongjun segurou a pena de pavão verde enquanto carregava a Luz Sagrada Pentacromática e, com a outra mão, golpeou como se fosse uma espada. As facas de arremesso voaram como meteoritos na direção do peixe ao, ao mesmo tempo em que A-Tai abanou o leque três vezes e três tornados imbuídos com o poder de raio, geada e areia voadora surgiram respectivamente.
O interior do salão dos fundos foi destruído pelo peixe ao descontrolado. Quando ele estava prestes a esmagar outra parede e fugir para um palácio lateral, as flechas de Mo Rigen finalmente deixaram o arco enquanto ele gritava, “Recuem!”
Hongjun estava à frente, bloqueando a fúria do peixe ao. Ao ouvir o grito, deu um passo para trás, de onde Li Jinglong conseguiu agarrá-lo pela gola e puxá-lo de volta. As Sete Flechas Cabeça-de-Prego se agruparam, emitindo uma luz forte, assoviando enquanto atravessavam um pilar, atingindo o peixe ao e perfurando seu abdômen.  
Os três tornados vieram na sequência e derrubaram outra parede, que esmagou o peixe ao, atirando-o para uma praça do lado de fora do salão dos fundos do Palácio Daming.
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Notas de tradução:
[1] Tratante: No original, “servo/escravo”, um xingamento arcaico.
[2] “Festival dos Fantasmas” ou “Festival dos Fantasmas Famintos” (em chinês 盂蘭/Yu Lan), acontece no dia 15 do sétimo mês, de acordo com o calendário lunar. É neste dia que os espíritos e fantasmas saem para visitar os vivos (lembra o Dia de Los Muertos do México). Soltar lanternas: acredita-se que elas evitem desastres se você as soltar em água corrente (por exemplo, em um rio). Ponte Qushui: não existe atualmente uma ponte com esse nome, mas parece que existia um rio chamado Rio Qu que corria pelos Jardins Reais. Então esta ponte poderia ser uma que cruzava o rio em um ponto específico ou pode também apenas se referir a uma ponta sobre o rio.
[3] Peixe ao: já apareceu na nota de rodapé do capítulo 04. Relembrando e aprofundando, são peixes que inicialmente eram carpas que queriam saltar sobre o Portal do Dragão, mas, ao invés disso, acabaram roubando e engolindo uma pérola de dragão do mar, o que os transformou em criaturas com cabeça de dragão e corpo de peixe.  
[4] Li: medida chinesa que equivale a 500m. Ou seja, Hongjun o perseguiu por cerca de 10 km (20 li).
 [5] Fei Ao (飞獒): o primeiro caractere significa "voar" e o segundo significa "mastim/mastiff", ou seja, um cão voador que cumpre as ordens de seu mestre.
[6] Jie: literalmente irmã mais velha. Sufixo usado para uma amiga mais velha ou parente.
[7] Zhang: medida chinesa que equivale a 3,33m.
[8] Li Longji: imperador Xuanzong, o atual imperador. Seu nome de nascimento é Li Longji.
[9] Nó na garganta, no original, “nariz arder de emoção”, aquela sensação que temos pouco antes de chorar.
[10] Cun: sistema de medida chinesa que equivale a 3,33 cm.

[11] Sete Flechas Cabeça-de-Prego: uma arma mística que, em conjunto com o Livro das Sete Flechas Cabeça-de-Prego, pode ser usada como uma forma de maldição de longa distância, como um boneco de vodu. Basta escrever o nome da pessoa que se quer matar no livro e ela sofrerá vários infortúnios. Se ao fim de vinte e um dias a pessoa não estiver morta, as flechas devem ser enfiadas em um boneco de palha com o nome da pessoa escrito nele, que vai servir de parâmetro do corpo real e vai morrer. Nesta obra, no entanto, elas parecem ser apenas um artefato/arma mágica com a habilidade de serem invocadas de volta conforme desejo de seu dono.

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