domingo, 8 de novembro de 2020

[Novel] Xingpan Chongqi - Capítulo 02


Tradução: Foxita.
Revisão colaborativa: Sr. Raposo.

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Capítulo 02 - A Revolução dos Clones

De longe, do meio das ondas, veio o som eletrônico de um robô sentinela. A-Ka xingou em voz baixa, “Merda!”. Ele usou conjuntamente braços e pernas para puxar o homem para fora da câmara, colocou-o em suas costas e correu em direção a uma área mais elevada. Logo em seguida, a cerca de quatrocentos metros de distância, dois navios da guarda costeira cortaram o mar avançando em direção à praia.
O coração de A-Ka saltou em seu peito e ele continuou a segurar o homem enquanto escalava as rochas. O som de sirenes soou à distância e ele retirou um controle remoto do bolso da camisa. De dentro da caverna, veio um grande estrondo.
K cambaleou e caiu, com um rastro de fumaça arrastando atrás de si enquanto corria para fora.  A-Ka envolveu o homem com uma mão e, com a outra, agarrou o braço de metal de K, que se chocou contra as rochas algumas vezes, perdendo peças que se soltaram e rolaram para baixo caindo no mar.
A visão de A-Ka escureceu por completo e ele segurava o homem enquanto corria atrás de K de volta para a caverna.
Após vários minutos, A-Ka finalmente se recuperou e deu leves tapinhas no rosto do homem - ele ainda estava inconsciente. Com largas passadas, K retomou sua posição original e ficou novamente em silêncio.
A-Ka rastejou para fora da caverna e espiou para baixo, vendo os robôs de vigilância levarem embora a câmara de dormir. Agora não havia sobrado nada dela, apenas o homem que trouxera de volta consigo.
Um humano.
A-Ka observou o homem que estava profundamente adormecido e sentiu-se repentinamente desamparado: que utilidade tinha um humano? Se fosse a câmara de dormir, ele ao menos poderia retirar dela alguns materiais. Ainda assim, jogar o homem de volta ao mar não era algo que A-Ka cogitava fazer.
No fim, que diferença fazia? Este era o cenário agora.
A-Ka se levantou e caminhou até K, dando continuidade aos ajustes no sistema de navegação. O chip que ele havia subtraído do corpo do clone realmente estava quebrado, pois quando A-Ka ligou o sistema de áudio, ouviu estática.
“...falha no sistema," o som saiu do alto falante de K.
“Ah!” A-Ka levou um grande susto; ele nunca imaginou que K fosse capaz de falar por conta própria. O que estava acontecendo? Ele certamente não tinha instalado um software de inteligência artificial em K!
K parou de falar e ficou novamente em silêncio; seus olhos frios encaravam A-Ka fixamente. A-Ka estava bastante desconfiado; ele abriu a placa de circuito que ficava no abdômen de K e ajustou o canal de controle de voz.
“A operação 'Morte ao Pai' deve ser...” K falou novamente.
A-Ka se assustou de novo, mas desta vez ele encontrou a origem do som: vinha do chip de navegação. Algumas estranhas mensagens haviam sido inseridas nos registros dos dados de localização. A-Ka conectou o resto do circuito e novamente começou a transmitir os dados do sistema de navegação. Ele então ouviu uma série de palavras que perturbou seu coração e tirou sua alma de alinhamento.
“Atenção membros da rebelião, o momento crucial da revolução se aproxima. O codinome é: Operação 'Morte ao Pai'. Será o fim dos nossos dias de opressão e o começo de uma nova era. No vigésimo sétimo dia do décimo primeiro mês, ao meio-dia, quando chegar o momento da troca de turno com os humanos, nós vamos romper as defesas e exterminar todos os robôs que tentarem nos parar com uso da força. Quando os distritos ficarem sem energia, os membros da rebelião deverão se dividir em grupos e se esgueirar na região do reator central. O sistema de defesa será desativado pela vanguarda. Nosso objetivo é explodir o Depósito de Energia Central e aniquilar o ‘Pai’. Que todos tenham êxito em suas missões.”
A-Ka estava tão atordoado que lhe faltavam palavras. Tudo o que podia fazer era ficar ali parado, encarando K boquiaberto.
O vigésimo sétimo dia do décimo primeiro mês. Hoje era o vigésimo quinto dia... aquilo era algum tipo de piada? A-Ka estava tendo dificuldade em acreditar. No entanto, aquele chip de navegação tinha sido extraído do corpo de um clone, que não fazia ideia que A-Ka o havia roubado. Logo, não era possível que aquela parte da narração tivesse sido plantada de antemão.
Ou seja, em no máximo quarenta e oito horas, clones e humanos se aliariam para começar uma revolta cujo objetivo era destruir o Computador Central.
A-Ka só conseguia sentir que as coisas que aconteceram naquele dia eram realmente inacreditáveis... a ponto de sequer perceber que o homem resgatado na praia já estava acordado.
A-Ka se virou atordoado e esbarrou bruscamente no peito do homem. Ele gritou alto ao ter o rosto atingido por um punho e caiu pesadamente no chão.
Os olhos do homem estavam cheios de intenção assassina enquanto encarava A-Ka friamente.
Sob a luz que K emitia, eles se encararam em silêncio por quase meio minuto. A cabeça de A-Ka zunia e ele estava prestes a explodir. Por um longo tempo, ele não conseguiu dizer nada e continuou a lutar.
“O que você tá tentando fazer?” O homem perguntou friamente.
Os olhos de A-Ka tinham lágrimas de raiva e ele tossiu violentamente enquanto engolia ar.
"Eu salvei você!" A-Ka rugiu para ele como se tivesse ficado louco. "É assim que você trata a pessoa que salvou sua vida?"
"Oh," o homem mediu A-Ka da cabeça aos pés com frieza.
No momento em que A-Ka levantou o olhar, ele ficou um pouco atordoado. Aquele era um jovem de vinte e poucos anos, com pele bronzeada e corpo bem-construído; o cabelo era curto e o comprimento estava alinhado, como se tivesse acabado de crescer. A linha de seus lábios era distinta e afiada como o gume de uma faca; sua ponte nasal era alta; os olhos eram brilhantes e penetrantes e as sobrancelhas pareciam feitas de tinta preta.
Os braços dele eram longos e ágeis, o abdômen tinha músculos bem traçados e fortes, ao passo que os músculos do peito eram magros. Ele parecia uma escultura de um herói dos tempos antigos.
Em seu peito estavam grudadas gotas de petróleo bruto, que tinham sido espalhadas quando A-Ka o carregou agora há pouco. No entanto, isso não diminuía em nada a beleza daquele corpo perfeito - era o tipo de beleza de um homem que tinha masculinidade em abundância. O óleo negro brilhava com as cores do arco-íris, acrescentando uma camada de charme robusto.
"Qual... seu nome?" Perguntou A-Ka.
"Nome..." O homem franziu o cenho ligeiramente, como se estivesse perdido em pensamentos.
A-Ka estava prestes a se levantar quando o homem se moveu novamente. A-Ka se assustou e recuou alguns passos.
A-Ka tinha inúmeras e variadas suspeitas em relação àquele homem e estava também cheio de dúvidas. De onde ele veio? Como funcionava a câmara em que ele dormia? Ele realmente tinha dormido no fundo do oceano por três mil anos? A-Ka sabia que quando o ciclo de sono durava mais de um mês, as memórias da pessoa seriam gravemente afetadas em razão do desligamento do cérebro. Por isso ele não estava muito surpreso com o fato de que o homem demonstrasse sinais de amnésia.
O homem falou friamente, "Como você me resgatou?"
A-Ka respondeu, "Você acabou de acordar depois de ser tirado do mar..."
A-Ka, então, descreveu a cena em que o tirou da água, mas enquanto ouvia a explicação, o homem continuava a observá-lo com os olhos cheios de dúvida. Conforme A-Ka falava, ele pensava consigo mesmo, essa pessoa realmente perdeu a memória.
"Três mil anos..." o homem falou finalmente.
"Sim," A-Ka respondeu ao mesmo tempo em que percebia um sério problema - o homem havia dormido por três mil anos, então era possível que as memórias afetadas jamais retornassem.
O homem estava absorto em pensamentos e se esforçava ao máximo para tentar se lembrar. Mesmo assim, A-Ka não podia evitar sentir-se um pouco feliz e falou, "A tecnologia da câmara de dormir em que você estava era muito boa. Suas habilidades de falar e pensar foram mantidas quando acordou."
O homem não disse nada.
A-Ka perguntou, "Como você se chama? Pelo menos pense num nome.”
O homem ficou em silêncio.
A-Ka disse, “Ou então que tal eu te dar um nome temporário? Na câmara de dormir estava escrito 'Heishi'. Você provavelmente se chama 'Heishi', certo?”
“Heishi…” o homem murmurou.
Ele não rejeitou o nome, como se seu silêncio implicasse em aceitação.
A-Ka cobriu bem K com a lona novamente e então puxou um pedaço de tecido, indicando que Heishi deveria se cobrir com ele. Com alguns alfinetes, A-Ka transformou o tecido em um simples robe de corpo inteiro.
Ao usar aquele robe de linho em peça única, Heishi parecia uma estátua sentada na pedra em silêncio.
Como A-Ka tinha temporariamente acalmado Heishi, ele aproveitou a oportunidade para abrir o sistema de navegação de K e ouvir novamente a mensagem. Sem sombra de dúvidas, naquele momento, a transmissão revolucionária dos clones era muito mais importante que Heishi. Ele sequer se atrevia a pensar no que iria acontecer se aquilo fosse verdade.
Haveria uma revolução? A-Ka praticamente podia imaginar a cena: os clones correndo para o Distrito Central, dominando a Cidade das Máquinas e explodindo o Depósito de Energia. Assim que a guerra estourasse, ele próprio seria capaz de facilmente pegar uma fonte de energia, correr para a praia, instalar a fonte em K e fugir dali.
A-Ka estava ao mesmo tempo radiante e nervoso, como se a mensagem fosse uma injeção de adrenalina que tivesse perfurado seu peito. Conforme sua mente se enchia com a imagem de robôs desmantelados e avariados, ele decidiu que voltaria e assistiria o desfecho da revolução.
A-Ka passou por Heishi e disse, "Vou indo."
Heishi ergueu a cabeça sem entender, seus olhos num misto de apreensão e desamparo. A cabeça de A-Ka começou a doer novamente; o que ele deveria fazer com essa pessoa com amnésia que havia resgatado? Levá-lo junto com ele? A pessoa parecia ser forte e talvez pudesse ser útil, mas ele certamente não poderia ser levado de volta para a área de habitação ou as consequências de ser descoberto pelos guardas-robôs seriam inimagináveis.
“Onde você vai?” Heishi perguntou.
A-Ka respondeu infeliz, “Não é da sua conta, forasteiro. Eu salvei sua vida e você nem mesmo agradeceu.”
Heishi não respondeu e ao invés disso perguntou, "Você tem comida?"
A-Ka estava prestes a explodir de raiva quando falou irritado, "Você não consegue encontrar comida sozinho? Eu não te devo nada!"
O espaço entre as sobrancelhas de Heishi estava cheio de ressentimento quando ele olhou ao redor.
Já chega, pensou A-Ka, salvar essa pessoa não me trouxe nada além de problemas. Ele saiu da caverna, mas por motivos incompreensíveis continuou a se sentir um pouco preocupado. Ele finalmente deu meia-volta e entrou de novo na caverna.
"Aqui tem comida e água potável". A-Ka abriu um depósito de comida que mantinha no canto e o mostrou para Heishi, que estendeu a mão e apanhou uma garrafa d'água, dando um gole. Em seguida, ele inclinou a cabeça para trás e esvaziou a grande garrafa. Só então, A-Ka percebeu que estava com bastante sede.
"Você tá com fome?" A-Ka perguntou enquanto abria uma lata e a entregava para o outro. Heishi hesitou por um instante, mas depois usou um dedo para tirar um pedaço de carne de frango de dentro da lata, colocando-o na boca e mastigando.
A-Ka falou, "Vou indo, você... se cuida, tá bem? Ache algum lugar pra ir."
O relógio no pulso dele começou a apitar e A-Ka sabia que não podia continuar enrolando, pois já havia ficado fora por tempo demais naquele dia. Ele correu para fora da caverna e percorreu o caminho que havia pego para chegar até ali.
As preocupações pesavam no coração de A-Ka, que continuava a pensar na transmissão do sistema de navegação. E se aquilo fosse apenas uma piada? Era possível que fosse só uma piada?
O caminho de volta levava meia hora. Quando A-Ka chegou à lixeira, involuntariamente virou a cabeça e de pronto ficou boquiaberto: Heishi continuava a segui-lo, ziguezagueando pelo óleo da praia ao fazê-lo.
"Pare de me seguir!" A-Ka gritou ansioso.
Heishi parou e A-Ka correu alguns passos na direção dele dizendo, "Não busque sua morte!"
A expressão de Heishi era fria e calma e o relógio de A-Ka novamente apitou em advertência. Não havia mais tempo. Ele gritou alto, “Vá embora daqui! Pra qualquer outro lugar! Não me siga!”
E assim, A-Ka mergulhou de cabeça na rampa de lixo, engatinhando enquanto subia.
Ele seguiu o mesmo caminho para voltar para os alojamentos e cuidadosamente lançou um olhar em direção ao chão próximo à rampa de lixo. Desta vez, ele encontrou pegadas - duas sequências de confusas pegadas!
Ou seja, depois que ele entrou na rampa de lixo, alguém mais passou por ali!
Estas eram pegadas de um humano. E mais, depois que a pessoa entrou, ela não voltou a sair. Como isso era possível?! A-Ka não conseguia acreditar no que estava acontecendo. Ele queria voltar e checar, mas não tinha mais tempo. Ele pôde apenas ir embora às pressas, com o coração quase saindo pela boca. Agora sabendo que um humano havia encontrado aquela saída, ele teria que diminuir a quantidade de vezes que visitava o mundo exterior.
Quando subiu as escadas, A-Ka quase foi novamente flagrado pela câmera. Ao chegar na próxima escada, ele pensou consigo mesmo, essa foi por pouco, eu quase perdi minha vida ali.
A câmera de vigilância equipada com laser mais uma vez se virou para um ponto em que não havia ninguém e A-Ka subiu lentamente com as costas pressionadas contra a parede enquanto olhava para fora.
Na área de habitação as coisas estavam como de costume, não havia nada fora do normal. Vários clones conversavam no corredor e A-Ka passou por eles ao voltar para os dormitórios. Ele subiu para sua câmara de dormir e fechou os olhos.
Sua mente ainda estava cheia de agitação pela revolução que se aproximava, mas seu corpo não tinha mais energia para lutar contra o sono e, aos poucos, ele acabou adormecendo. De repente, um barulho enorme veio do Compartimento do Reator Central e a explosão que se seguiu era como a luz radiante do sol, dispersando-se sobre toda a Cidade das Máquinas. Todos os prédios, humanos, clones e androides foram transformados em cinzas sob o forte calor e a luz intensa...
"O período de sono se encerrou," anunciou a voz eletrônica. "Concluindo modo de dormir.”
A escotilha da câmara se abriu automaticamente e A-Ka despertou de seus sonhos com a testa coberta de suor.
“A-Ka, você está bem?” Perguntou um dos humanos.
A-Ka mal conseguiu anuir, pois sentiu a cabeça girar. Ele usou a câmara de dormir para se apoiar, mas tropeçou e cambaleou. Diversas pessoas se aproximaram para ajudá-lo a levantar.
“Você teve um pesadelo?” Alguém perguntou preocupado.
A-Ka respondeu, “Sim... sim, tive.”
Ele quase não conseguia distinguir sonhos da realidade e sentia que tudo o que aconteceu nas últimas seis horas foi apenas um sonho.
As pessoas iam e vinham; A-Ka ficou parado do lado de fora dos dormitórios por um longo tempo, refletindo sobre as coisas que tinham acontecido. O sino tocou, relembrando-o que tinha duas horas para ficar pronto e que, ao final delas, teria que sair para trabalhar.
A-Ka se dirigiu ao refeitório para comer. Comparada à última vez que esteve ali, havia um novo grupo de pessoas no local. Assim que se sentou com uma infinidade de pensamentos inundando sua mente, um robô deslizou para perto dele e disse, "Número de identificação 470023A, seus visitantes aguardam na sala de espera. Por favor, chegue lá em menos de cinco minutos."
Um visitante? A-Ka aleatoriamente enfiou alguns pedaços de comida na boca. Quando caminhou até o corredor, ele viu dois clones parados do lado de fora da sala de espera.
Todos os clones tinham o mesmo rosto e compleição física e cada um deles usava uniforme de acordo com as tarefas que desempenhava. Assim que os avistou, o coração de A-Ka deu um pulo.
"Você roubou meu chip de navegação," o clone se apressou na direção dele. "Me devolva agora mesmo e vou ignorar os erros que cometeu."
"Que... que chip?" A-Ka inconscientemente levou a mão ao bolso da camisa, mas seus dedos tatearam o vazio. Ele se lembrou que tinha instalado o chip no corpo de K, mas realmente havia se esquecido de trazê-lo de volta.
"Não se faça de tonto," outro clone se aproximou e intencionalmente abaixou o tom da voz. "Você não tem motivos para manter aquilo. Assim só vai criar problemas para si próprio e para os outros humanos, que acabarão sendo executados.”
“Você não tem autoridade pra fazer isso!" A-Ka respondeu com raiva. Em poucos segundos, ele clareou a mente e entendeu porque os clones não se atreviam a dizer aquilo em voz alta: a gravação no chip era real, não tinha sido um sonho. Ele estava tão nervoso que mal conseguia respirar, e tremeu ao dizer, “Eu não peguei seu chip de navegação.”
"Você o trocou!" O clone falou entredentes. Com o movimento rápido de uma mão ele agarrou o pescoço de A-Ka. “Onde está o chip?! Devolva!”
O rosto de A-Ka ficou totalmente vermelho e ele percebeu a câmera de vigilância do corredor se virar na direção deles. No entanto, as emoções do clone já estavam fora de controle e ele apertou os dedos na garganta de A-Ka, fazendo com que um som triturante saísse da cartilagem das vias respiratórias. A visão de A-Ka começou a escurecer.
"Pare!" O companheiro do clone o impediu de matar A-Ka.
O clone afrouxou o aperto e A-Ka se ajoelhou no chão com dificuldade de respirar.
"Eu não peguei o chip... cof... cof!" Ele respondeu com enorme dificuldade.
“Os guardas estão vindo!” Outro clone avisou. “Eles já nos viram; você não pode continuar falando com ele. É melhor pensar em outro jeito para levá-lo daqui.”
“Só espere pra ver," falou o clone com o rosto sombrio.
Os dois clones foram embora e A-Ka sabia que eles definitivamente não o deixariam se safar. Ele se ajoelhou no corredor enquanto pensava nos próximos passos: era tarde demais para sair e recuperar o chip e, mesmo que o devolvesse, seria inútil. E se ele o trocasse por outro chip?
A-Ka se apoiou na parede, sua boca estava cheia do gosto de sangue. Ele saiu para tomar um gole de água e molhar o cabelo, mas neste exato momento, o sino emitiu um sinal para que se reunissem. Tão logo ele soou, todos os humanos se dirigiram o mais rápido possível para o Salão de Conferência.
Droga, as coisas estão acontecendo rápido demais. A-Ka sabia que os clones tinham alertado os guardas-robôs daquela área para que reunissem todos os humanos. Talvez eles aproveitassem a oportunidade para pegar um certo humano e levá-lo dali a força.
Ainda assim, ele não podia deixar de ir.
A-Ka entrou na área de encontro. Ele olhou ao redor, e o local estava lotado de pessoas. De todos os lados, vinha o barulho da multidão. As portas de aço se fecharam, prendendo dezenas de milhares de pessoas dentro do grande salão. Uma forte luz se acendeu, brilhando de forma tão intensa que os humanos não conseguiam manter os olhos abertos. No espaço preenchido pela escuridão, o brilho da luz os deixou ainda mais assustados. Dois guardas-robôs escoltaram um humano para o centro do palco e um clone veio logo em seguida.
A-Ka congelou. A pessoa no palco vestia um robe de linho; ele permanecia ali descalço e com as mãos presas por um par de algemas magnéticas - era Heishi, a pessoa que ele havia resgatado do mar algumas horas atrás!
“A polícia o encontrou em frente à escada de acesso que leva à lixeira," anunciou o clone para as pessoas ali reunidas. “Este humano de origem desconhecida não possui número de identificação, não pertence a nenhuma seção e não sabe de nada. Ao resistir à prisão, ele matou dois executores. De acordo com o artigo primeiro da Lei de Controle dos Humanos, ele deve ser condenado à morte.”
A-Ka prendeu a respiração.
“Mas ele nos disse que veio até aqui com o objetivo de encontrar um humano. Tal humano está entre vocês neste exato momento,” o clone falou leve e placidamente. “Por favor, dê um passo à frente e esclareça as origens desta pessoa.”
A multidão começou a cochichar entre si e o coração de A-Ka quase saltou para fora de sua boca. Sua mente estava em branco. Ele não havia dito para que Heishi não o seguisse? O que exatamente estava acontecendo?
O braço de um guarda-robô girou, revelando um cortador magnético que pairou sobre a cabeça de Heishi.
Heishi levantou os olhos para ver o cortador magnético que emitia uma luz azul. Os feixes hexagonais de alta tensão chiaram e estalaram. Bastava o puxão de um braço e a cabeça de Heishi seria cortada em seis pedaços.
O clone então disse, “Darei a todos vocês mais dez segundos. Se o conspirador não se apresentar, essa pessoa será imediatamente exterminada e iniciaremos uma investigação pelo Formigueiro.”
"Atenção. Iniciando procedimento de execução em dez, nove, oito..."
Heishi ignorou o guarda-robô e ao invés disso virou o olhar para o grupo de pessoas abaixo do palco. Sua expressão era fria e tranquila, mas seu olhar era perscrutador. A multidão começou a ofegar de choque, pois aquele inocente homem no palco claramente não tinha ideia de que seu cadáver estava prestes a cair no chão.
"Seis, cinco, quatro..."
"Espere," A-Ka deu um passo à frente enquanto falava em direção ao palco, "Foi..."
Ele sequer teve tempo de reivindicar o estranho, quando Heishi repentinamente se virou. Com um chute, ele mandou o guarda voando para longe e em seguida saltou na direção de A-Ka. O salão inteiro explodiu em caos. A-Ka não tinha ainda recuperado os sentidos quando Heishi pousou em sua frente.
"Situação crítica."
Raios de luz voaram na direção deles e A-Ka gritou, "Se abaixa!"
Ele pulou sobre Heishi, derrubando-o no chão e imediatamente as luzes no salão se apagaram. Em seguida, Heishi levantou A-Ka pela gola e falou, “Venha comigo.”
A-Ka respondeu, "Nós vamos morrer! Não lute com eles!"
Dois guardas voadores vieram da direita e da esquerda, e Heishi se virou no próprio eixo, executando um belo chute giratório. Os guardas voadores foram varridos para o lado, batendo contra a parede em explosões violentas.
A-Ka ficou mudo. Ele tinha visto esse tipo de habilidade apenas uma vez em seus materiais de estudo. Era uma espécie antiga de arte marcial!
“Hei... Heishi!” A-Ka estava prestes a falar para o outro se render, quando as portas à direita se abriram. Guardas-robôs invadiram o local, mas Heishi avançou em vez de recuar e correu em direção ao túnel pelo qual vinham os guardas mecânicos.
As sirenes soaram alto e A-Ka pensou, é o fim, já era.  Tudo aconteceu tão rápido que ele não teve nem meio segundo para responder antes de Heishi perguntar, “Que lugar é esse?”
A-Ka dissolveu as dúvidas em seu coração e falou, “Corra pro fim do túnel!”
Heishi agarrou A-Ka e correu na direção indicada. A-Ka gritou novamente, “Vire à esquerda!”
Os dois fizeram a curva em vertiginosa velocidade, atingindo uma pessoa que estava ali atrás. A esta altura, o Formigueiro inteiro já tinha sido alertado pelas sirenes que tocaram no salão principal e todas as portas tinham sido trancadas. Ainda assim, A-Ka se segurava ao fio de esperança de que, ao chegarem nos alojamentos, conseguiriam correr até a rampa de lixo e talvez fugir por aquele caminho.
No ponto em que as coisas chegaram, este era o único jeito...
Todavia, Heishi derrapou e parou; A-Ka sentiu o coração bater violentamente.
No fim do túnel, atrás do clone e em frente à única saída do Formigueiro, que era pela rampa de lixo, estavam dois Exterminadores.
“Não ataque," a voz de A-Ka tremia ao falar. “Não importa o que aconteça, não ataque...”
Os Exterminadores humanoides eram um tipo de androide especialmente feito para lidar com humanos e foram equipados com espingardas com sistema de rastreamento infravermelho. Se eles começassem a atirar naquele estreito túnel, Heishi e A-Ka seriam imediatamente mortos.
Heishi também sentiu instintivamente o perigo e deu um passo para trás. Atrás dos dois, no entanto, havia ainda mais guardas-robôs bloqueando o caminho. Na frente, estavam o clone e dois Exterminadores, e atrás havia uma tropa inteira de guardas-robôs trazendo consigo algemas magnéticas.
O clone falou, "Parece que você causou um problemão, pirralho."
A-Ka não pôde evitar recuar ao reconhecer aquele clone: era exatamente o que havia exigido a devolução do chip algum tempo atrás. Mas assim que deu um passo para trás, suas costas encostaram na abertura da arma de um guarda-robô.
Outro clone perguntou, "O que exatamente está acontecendo?”
A-Ka imediatamente virou a cabeça para trás e disse, "Sou eu! Eu sou a pessoa que o forasteiro procura!”
Quatro guardas-robôs se aproximaram e encurralaram A-Ka. Eles lhe colocaram um par de algemas magnéticas e prenderam seu pescoço com um equipamento semelhante a um capacete de laser. A-Ka sinalizou com o olhar para que Heishi não resistisse.
Heishi ficou em silêncio.

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